sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Sobre o Amor

Então Almitra disse, fala-nos do Amor. 

E ele ergueu a cabeça e olhou para o povo e caiu uma grande imobilidade sobre eles. E em voz poderosa ele disse: 

Quando o amor vier ter convosco, 

Seguros embora os seus caminhos sejam árduos e sinuosos. 

E quando as suas asas vos envolverem, abraçai-o, embora a espada oculta sob as asas vos possa ferir. 

E quando ele falar convosco, acreditai, 

Embora a sua voz possa abalar os vossos sonhos como o vento do norte devasta o jardim. 

Pois o amor, coroando-vos, também vos sacrificará. Assim como é para o vosso crescimento também é para a vossa decadência. 

Mesmo que ele suba até vós e acaricie os mais ternos ramos que tremem ao sol, 

Também até às raízes ele descerá e abaná-las-à 

Enquanto elas se agarram à terra. 

Como molhos de trigo ele vos junta a si. 

Vos amanha para vos pôr a nu. 

Vos peneira para vos libertar das impurezas. 

Vos mói até à alvura. 

Vos amassa até vos tomardes moldáveis; 

E depois entrega-vos ao seu fogo sagrado, para que vos tomeis pão sagrado para a sagrada festa de Deus. 

Toda estas coisas vos fará o amor até que conheçais os segredos do vosso coração, e, com esse conhecimento, vos tomeis um fragmento do coração da Vida. 

Mas se, receosos, procurardes só a paz do amor e o prazer do amor, 

Então é melhor que oculteis a vossa nudez e saiais do amor, 

Para o mundo sem sentido onde rireis, mas não com todo o vosso riso, e chorareis mas não com todas as vossas lágrimas. 

O amor só se dá a si e não tira nada senão de si. 

O amor não possui nem é possuído; 

Pois o amor basta-se a si próprio. 

Quando amardes não deveis dizer "Deus está no meu coração", mas antes "Eu estou no coração de Deus". 

E não penseis que podeis alterar o rumo do amor, pois o amor, se vos achar dignos, dirigirá o seu curso. 

O amor não tem outro desejo que o de se preencher a si próprio. 

Mas se amardes e tiverdes desejos, que sejam esses os vossos desejos: 

Fundir-se e ser como um regato que corre e canta a sua melodia para a noite. 

Para conhecer a dor de tanta ternura. 

Ser ferido pela vossa própria compreensão do amor; 

E sangrar com vontade e alegremente. 

Despertar de madrugada com um coração alado e dar graças por mais um dia de amor; 

Repousar ao fim da tarde e meditar sobre o êxtase do amor; 

Regressar a casa à noite com gratidão; 

E depois adormecer com uma prece para os amados do vosso coração e um cântico de louvor nos vossos lábios.  

de Khalil Gibran (in "O profeta"- acesso integral download PDF -19 pgs)

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